18 de maio de 2009

Procurando Âncoras


"não há sinal de porto algum" (Mauro Fonseca)
Um aperto no peito. Vontade de fechar a porta e nunca mais voltar. Desacreditar que o fim é certeza. Queria eu poder encurtar distâncias e sempre ouvir o sim. Um sim.
Quando resolvi me dedicar ao trabalho voluntário num abrigo de idosos, tinha a plena consciência de que perdas viriam e seria preciso força para contorná-las e não esmorecer no caminho. Acabei me afeiçoando, me apaixonando tanto pelo lugar quanto pelos que ali moravam. Entrei com a idéia fixa de que seria útil, ajudaria. Hoje, saio todas as semanas com o sentimento de que sou infinitamente ajudado e envolvido numa atmosfera de amor, respeito e espera.
Alguns esperam a morte, outros a semente que irão se tornar.
Ao entrar naquela casa, tinha em mim o desejo de aprender a lidar com uma questão sempre presente em minha vida: a morte. Desde sempre fui exposto à ausência, de pai, avôs, tios e até mesmo dos que tentaram ser presentes, mas fracassaram. Queria arar a terra, preparar as lágrimas que um dia viriam (virão!) pela perda da figura mais presente na minha história: minha pequena grande avó.
O abrigo foi me modelando, e esse ano completo 4 anos de trabalho e somo algumas perdas, ainda não naturais. No ano passado, formatei e desenvolvi um informativo em que minha intenção principal seria registrar e incluir os residentes daquela casa. A idéia carregou outro importante ator daquele espaço: os voluntários. Desde sua implementação venho desenvolvendo perfis mensais, com a idéia certa de que aquele registro será importante numa posteridade. Mas agora, com lágrimas nos olhos e dor no coração, percebo que não marquei apenas os que dormem e acordam naquele belo lar, mas deixei relatado o trajeto emocionante de tantos amigos que passam (ou passaram) por lá.
Minhas palavras não foram o bastante para revelar o amor que tantas pessoas dedicaram àquele porto. Porto esse que hoje ancora minhas angústias e meu sofrimento em dizer que as coisas passam... Despedir-se é doloroso e amargo, mas necessário. Trabalhar com essa aflitiva questão, é para mim, tarefa pertubadora e um pouco aterrorizante. Mas sigo me envolvendo cada dia mais com essas verdades que não esperava guardar em meu baú.
Sigo colhendo âncoras e desvendandos portos, na certeza de que um dia não mais os terei, e aí, tiro os sapatos e danço o resto da vida.

* Por muito tempo, esperei escrever sobre a Fundação Espírita João de Freitas, sobre meu trabalho e sobre as tantas realidades que encontro, mas nunca tive fôlego para me emocionar tanto. Agora, perdido um grande amigo, me vejo impaciente, tentando relatar minha angústia e minha serenidade, sentimento tão díspares que dentro de mim, agora, dão-me a certeza de que tudo vale a pena naquela Casa.
Dedico este texto, à mim.