27 de julho de 2009

Quando voltei

Quandro abri a gaveta meu susto imediatamente a fechou. Não haviam minhas verdades guardadas naqueles papéis, naquelas fotografias, naqueles obejtos.
Voltava àquela casa depois de 30 anos, numa emoção profunda. Minha tarefa, solicitada por minha irmã que estava abalada com a morte de nossos pais, era limpara toda a casa. Havíamos vendido aquela grande lembrança, cheia de quartos, uma larga cozinha e um pé direito maior que nossas memórias. Comecei pelo quarto de mamãe, mulher calada, que guardava tudo e por isso tinha um quarto em constante bagunça.
Minhas lágrimas iam rolando junto ao lixo que ia recolhendo. Nossas verdades não eram aquelas.
Aquela casa ficava onde fincamos nossas raízes. Aquelas cortinas já esconderam muitos namoros, aquelas janelas já presenciaram muitas fugas noturnas, a cozinha já nos viu diversas vezes esfomeados pelas descobertas alucinantes, os banheiros já sentiram muitas vezes nossos delírios solitários e sexuais, nossos quartos nos fizeram mais humano e menos humanos.
Mas nada daquilo guardava o que sabíamos. Ou fingíamos.
Não reconhecia aquelas dolorosas história. Não reconheci, quando abri o armário, aquela imensa camisola de mamãe. Minhas lembranças viam ela magra e esbelta. Minha lembrança não viam as panelas pretas e amassadas, não viam os tantos trabalhos que mamãe tinha de fazer naquela altura da vida. Minhas lembranças não viam dor, nem verdade.
Desisti de limpar aquele martírio. Chamaria nossa ajudante e no dia seguinte ela faria tudo que eu pedisse. Ás lágrimas fechei as janelas e tranquei a porta. Tirei a placa amarela que colocamos na janela esquerda. Olhei para trás e disse um adeus. Despedi-me da realidade de minha família, aceitando, para sempre, as mentiras que construímos para amar.