4 de dezembro de 2009

Enquanto espero

Nos primeiros anos não sentiu muita falta. Ganhava presentes das vizinhas, dos primos distantes, das colegas de serviço da mãe e até mesmo das clientes da avó. Carrinhos, bolas, roupas e mais um monte de embrulhos eram a grande distração enquanto os grandões se reuniam ao redor da mesa. As luzes, que piscavam na borda da janela, também lhe fascinaram durante aquelas horas em que alguns se emocionavam e se abraçavam.
A medida que a idade avançava, as distrações se tranformaram em aflição e angústia. Faltava um presente, dentre os poucos que, agora, lhe eram ofertado. Numa espécie de jogo, tentava adivinhar o que o pai poderia lhe dar. Aos 6 esperava uma caixa de playmobil, para completar sua coleção dos piratas. Aos 7, quem sabe, um quebra cabeça. No ano seguinte estaria satisfeito com um all star de avião. Depois, poderia ser uma pista de corrida para seus carrinhos dados pela avó. Aos 10 queria um disco do Jordy. Aos...
O tempo passava, os anos terminavam e junto traziam a melancolia da ausência. Mentira ao dizer que acostumara-se. A cada ano a saudade era tão diferente quanto os presentes que julgara poder receber do pai.
Na adolescência, a paixão pelos livros era a mais sincera forma de aproximar-se do impossível. Chorou ao ler "Meu pé de laranja lima". Desejava, como recompensa pelas brilhantes notas, livros dos mais variados gostos. Aos 15, descobrira Clarice Lispector, o que poderia render longos anos de idéias para os presentes. Aos 20, com ainda menos embrulhos na cama, aguardava ansioso pelo filme de Almodóvar. Aos 30, eram roupas seu maior desejo.
Mas daí adiante, os filhos iam crescendo, as meias chegando, os lenços transbordando pelas gavetas, e o coração aquietando. Já não esperava novidades. Daí pra frente era hora de começar a contagem pelo encontro, que a certeza lhe dizia ser o maior presente da vida.