16 de março de 2010

Panos sobre espelhos e música alta

Quando Antônio desligou, tenho a certeza de que não sabia nada sobre quem sou agora.
Não sabia como cheguei exausta, deixando a bolsa na mesa da sala e correndo para o banheiro, passando com a minha velocidade de sempre, a toalha já suja, pendurada num prego torto. Não sabia do quanto tremi para entrevistar meu ídolo de infância e redigir uma matéria sem a certeza de que seria publicada. Não imaginava que há poucas horas eu estava sentada num banco alto me refestelando com três empadas e uma coca de um real. Não passava pela cabeça dele o meu olhar longe às seis horas da tarde, pensando nos amigos que deixei de encontrar, nos amores que deixei de viver e nas cervejas que esqueci de tomar. Antônio não me enxergava na insegurança de uma unha mal pintada, nem no batom negligenciado. Não percebia os jornais se amontoando no canto do quarto, intactos. Não se ressentia por não ter elogiado meu novo vestido, comprado com o suor dos sábados sem descanso. Não se importava com minhas olheiras e minhas negativas, acrescidas pela voz baixa e lágrimas sempre á espreita.
Quando Antônio desligou, não sabia da mulher que, agora, desconheço por medo.