27 de dezembro de 2010

Feitor de mapas

Entrei nesse emprego para reconstruir. Aceitei o trabalho por poder construir. Um pouco por influência de vovó, que costurava gigantescas telas com seus inúmeros e coloridos retalhos. Outro pouco pelo pedido de uma mãe amarelada, entrevada num leito, por seguidos copos de embriaguez.
Não sabia costurar e já havia me cansado, há muito, do álcool. Por isso, cheguei aqui. Por conta de tudo isso, decidi procurar.
E segui, primeiro desenhando em pequenas folhas. Logo, passei para cartolinas. Hoje já nem sei mais. Passei da metade, da décima nona vez.
Comecei com algumas poucas descrições de mamãe, que dizia castanhos os olhos e negros os cabelos. Presumo, hoje, fios brancos. Talvez, alguns traços, agora meus, eu, também perseguia.
Como bom mineiro, tratei rápido de refazer as bordas, pensando fechar o cerco. Acordava às 6 e pegava o ônibus. Quando chegava ao final, descobria existir mais alguns passos, que fazia com minhas novas e brancas galochas. Ia ao fim e voltava, atento, verificando becos, vielas, varandas e janelas. Para cada bairro, cerca de duas ou três semanas. Não deveria existir dúvidas. Tudo preciso.
Nunca entendi meu tio, que de ojeriza, hoje mora em bandas mais cheirosas. Nunca entendi seu pavor por essas terras. Nem meu primo, rapaz tão jovem, que a todas preferia, mesmo voltando para o acalanto dos pais. Dizia gostar de cidade grande. De minhas tias, guardo o mistério pela vida reclusa e calada. Gostaria de tê-los mostrado os tantos caminhos.
Conheci periferias das quais nem mesmo sabia o nome. Conheci senhoras e suas tantas águas. Descobri temperos dos quais nunca tive ciência alguma. Pimentas que já não ardiam. A cidade era mesmo grande.
Pequenas as chances, esgotado o trabalho, reiniciei. Sozinho, toda atenção pode ter sido pouca e todos os cantos, uma nova alameda. Talvez o chefe tenha percebido, mas nada disse. Deixou-me procurando a raíz, que logo após fruticar, perdeu-se nas terras das quais hoje, sou eu o maior conhecedor.