30 de novembro de 2011

Transcrição 001

(por favor, não divulguem meu nome) – pedido da entrevistada – anotação da transcrição

Meu nome é XXX, tenho quatro décadas de vida e trabalho numa casa de família. Sou cozinheira desde pequena. Não fumo. Bebo só de vez em quando, quando o meu marido faz uma festinha lá em casa. Tenho dois filhos grandes, um deles está formando em Educação Física. O outro tem uma filha e é casado e trabalha como vendedor. Meu marido é marceneiro e tem diabetes. Eu não tenho nada de saúde, sou até bem saudável. Cresci na roça e adorava subir num pé de manga que tinha na frente de casa. Gosto muito de fruta, mas o meu prato preferido é frango a molho pardo. Costumo fazer todo mês na casa dos patrões, eles também adoram. Minha patroa tem dois filhos do primeiro casamento e um filho com o meu patrão. Eles são médicos e moram numa casa muito bonita, cheia de jardim. A minha casa também é bonitinha, mas é uma pena que ela fica na beirada do trilho do trem. Uma vez minha sogra, que já até morreu, veio dormir na minha casa e acordou chorando quando ouviu o trem de madrugada. É muito ruim o barulho dele toda a hora, mas a gente já acostumou. Eu gosto dos meus vizinhos, menos da moça que mora na casa da frente. Ela parece que faz coisa errada. A casa dela tem um movimento que nem o mercado tem. Lembrei que eu adoro ir no mercado e comprar verdura, creme de cabelo e sabonete. Fico pouco em casa, passo o dia trabalhando, chego em casa vou no mercado e depois na igreja. Não sou carola mas não sei rezar em casa. Parece que lá em casa tem alguma coisa que não me deixa concentrar. Aí eu acabo não lendo, que é uma coisa que eu gosto de fazer e nem assistindo filme. Vejo mais novelas, mesmo. Gosto muito de história. Uma pena que a minha não seja tão interessante. Minha vida é boa mas é morna. Só feijão com arroz. As vezes eu fico desejando que aconteça alguma coisa. Fico pensando em passar mal, em viajar e sumir. Mas acabo não fazendo nada disso. Eu gosto dessa calma toda. Gosto da comida de todo dia, como diz minha patroa. É isso. Obrigada.


Transcrito por Dora S. P.




Todas as transcrições foram feitas pelo projeto Renascer, financiado pelo Governo Federal e realizado pelo Centro de Apoio Renée Michel. O projeto é desenvolvido por mulheres atendidas pelo CARM, que transcrevem e em seguida debatem entrevistas feitas com mulheres de variadas nacionalidades, faixas etárias e grupos sociais. As entrevistas são feitas com voluntárias, que devem responder a uma série de perguntas agrupadas num mesmo parágrafo e cujas respostas devem ser feitas num outro parágrafo sem auxílio de números, mas num padrão textual. São disponibilizadas duas folhas, apenas, às entrevistadas que redigem as questões à caneta de tinta vermelha. Iniciado há 78 dias, o projeto conta, até o presente momento com 35 entrevistas.