2 de fevereiro de 2012

Calada

- Do lado de cá parece que a janela está mais longe! - disse João, do alto do vigésimo andar.
- É, dá até um frio na barriga - falou, e depois sorriu. Os olhos de Laura brilhavam.
- Eu, às vezes, fico pensando nesses momentos decisivos: uma pessoa que pula do alto de um prédio, um prédio que cai, uma janela que se fecha, uma cinza de um cigarro que despenca da ponta já morta...
- Eu também. Já pensou que a cada segundo, a cada milésimo de segundo, muitas coisas acontecem?!
- E alguns dormem.
- É, alguns dormem enquanto outros dançam.
- É estranho. Parece que o tempo passa diferente para cada um.
- É uma falsa sensação de que estamos ligados.
- Cada dia mais tenho a certeza de que não estamos juntos, cada um na sua, cada um de um lado...
- ...cada um ouvindo uma música, vendo uma imagem diferente. Cada pessoa na sua vida.
- Isso é intimidade, né?! Alguns ficam tentando explicar, fazem mil teorias, surgem trocentas tentativas de acessar a intimidade. E tudo fracassa. Essa é a zona obscura da vida.
- Já parou pra pensar como somos arrogantes. Tudo não passa de uma ilusão de ótica. Quando estamos perto, a janela parece imensa. Mas é só correr e olhar de longe. Tudo muito de tamanho.
- Definitivamente, tudo é...
- ...relativo. E a gente insistindo em desenhar o superlativo.
- E a gente jurando que as coisas são compreensíveis.
- E a gente na certeza de que as coisas são fáceis.
- Que as coisas são, até mesmo, discutíveis.
- [...]
- Por isso eu prefiro silenciar, Laura.

E se amaram no silêncio da noite fria. As janelas se apagando, como pequeninas luzes de uma árvore de natal.