17 de fevereiro de 2011

inteiriço

O fracasso como assunto central na obra de Beckett é algo que muito me interessa. O fracasso de permanecer inteiro.
(Tatiana Blass – artista plástica, sobre sua exposição Fim de partida, baseada na peça homônima do dramaturgo)

As manias de se desculpar por tudo. A vergonha de estar em público. O medo da claridade. O horror à luz do sol. As rugas no rosto. Ansiedade. Aflição contínua.
Se Jorge se desejasse inteiro, ainda assim, seria pequeno e pouco. E assim gostava. Chegar quieto, passos mudos e ouvidos quase surdos. A voz baixa, o riso curto e os gestos contidos.
Saia, chegava, permanecia e ninguém notava. Trabalho posto, trabalho pronto. Sem elogios, sem perguntas e sem respostas. Amores nulos e a tímida alegria do desconhecimento.
Na família, o mais íntegro. No trabalho, o mais eficiente. Na rua, mais um. Assim, lembrava-se a irmã Norma, sozinha na sala escura onde o corpo de Jorge permanecia estático.